Ambição: onde está o erro?

Sempre acreditei que as palavras não deveriam ficar marcadas por uma “fama ruim” a partir da recorrência de seus usos em determinadas situações. Não a ponto de gerar em desfavor de si uma espécie de estigma, como um carimbo de condenação que vai eliminando os outros sentidos (bons) que ela possa ter, e faz com que nós, ao ouvi-las, imediatamente sejamos levados a uma circunstância ou hipótese ruim, a partir daquele sentido que sobressai.

Confesso não saber se esse é um mal que assola especificamente a Língua Portuguesa, ou se nas outras também ocorre esse fenômeno.

Essa estigmatização ocorre em vários casos e há uma série de palavras que, embora tenham acepções positivas (e são até necessárias, em muitos casos!) estão completamente “condenadas” pela língua. Quer um exemplo?  “Frio”, “calculista” (imagine como não se sente o Engenheiro, não?!). Ué, qual o problema de ser racional e calcular os riscos de uma situação?

“Meticuloso” é outra palavra que sofre também, coitada. O sujeito tido por meticuloso já é por si só um esquisitão pra geral. Já soa mal ao cidadão quando alguém o qualifica assim.

Agora há uma em especial que me incomoda. Gostaria de, com esse texto, deixar uma mínima contribuição para salvá-la, absolvê-la ou, com alguma certeza do insucesso do texto, pelo menos amenizar sua pena… E se chama AMBIÇÃO.

Por que ter ambição é errado?

Aliás, por que ambição é tida como palavra ruim? De sentido ruim?

Por que ela vem atrelada à figura de alguém mau, egoísta (olha o “frio e calculista” também se encaixando no contexto!), que usa de meios obscuros ou, digamos, moralmente questionáveis, para no famigerado “imaginário popular” “passar a perna” em alguém e obter algo, ou chegar em algum lugar? Por quê??

Se a vox Populi (que segundo o ditado é também a vox Dei) faz com que ambição seja ruim, qual palavra (boa) a gente deveria usar pra alguém que batalhe muito, com perseverança e honradez, que abdica de muita coisa, pra sair do lugar ou da situação em que se originalmente se encontra para chegar a uma posição, posto ou situação melhor pra si?

Bastante incomodado e não querendo “seguir o fluxo” geral que vê ambição como negativa, fui atrás de sua raiz etimológica. Eis que: vem do latim ambitio, ambitus, particípio passado de ambire, formado por “-AMB”, “ao redor” e “-IRE”, ir. Ou seja, “andar ao redor”, “buscar ao redor”, “ir ao redor” – subentende-se fora do ponto onde está – explicando portanto que o ambicioso é, basicamente, aquele que busca ir além de onde já está. A raiz da palavra explica O QUÊ ela é. Ao longo do tempo, as pessoas e os contextos se encarregaram de supor COMO é que se faz este “o quê”, condenando a palavra a maus modos daqueles que por ela são adjetivados.

Tudo bem que nem sempre a vida da gente é uma função do 1º grau com o fator positivo (e por isso, gráfico crescente). Mas mirar isto não pode ser mau...

Além do estigma de ser ruim, “ambição” também é palavra quase que sempre voltada ao ambiente profissional, já percebeu? Ninguém usa ambição para classificar um sujeito que quer tirar sua casa daquele estado “escangalhado” e organizá-la; muito menos para descrever um sujeito que está numa situação psicológica ou espiritual ruim e tem a ambição de buscar se tornar mais forte emocionalmente ou superar um grande trauma ou perda na vida.

Vem sempre no sentido de classificar o cidadão que quer, por meios escusos ou desonrosos, conquistar alguma coisa material. Palavras associadas: dinheiro, fama, poder, ganância, cobiça, inveja, “puxada de tapete” e outras como essas.

Se viemos a esta vida para evoluir em algum aspecto, ambição poderia (deveria!) ser usada também para âmbitos pessoais que não apenas o universo do trabalho, muito menos o foco de ganhar algo material. Menos ainda servir como elemento de associação pra que esse ganhar seja “tomando algo” ou “assumindo o lugar” de alguém.

Não deveria indicar que se trata de um mau sujeito. Apenas que ele veio a essa vida para não se conformar com a condição que lhe foi posta e batalhar muito para chegar a algum lugar. Superar a rigidez dos estamentos através de estudo, trabalho duro, construção interna. Superar as dificuldades que a vida impõe com tudo de esforço, nada de acomodação. Tudo de determinação, aplicação. Nada de zona de conforto. Sair de um ponto A, ali embaixo, para um ponto B, acima, ciente de que a jornada entre esses dois pontos exigirá “força de vontade e vontade de fazer força” (como dizia meu avô) e zero flerte com má-fé, mediocridade, pequenez de espírito, ou a dita Síndrome de Gabriela (“eu nasci assim, eu cresci assim, eu sou mesmo assim, vou ser sempre assim”), bastante comum inclusive em ambientes como o próprio meio profissional (especialmente no Serviço Público).

A definição desta senhora (que eu não conhecia) também é interessante. O ambicioso nunca conforma-se, mesmo nos sucessos. Quem praticou ou pratica esporte entenderá com mais facilidade isto. 

E você: o que e quais sentimentos vêm à mente quando se é posto em contato com a palavra ambição?

Ambição não deveria ser uma característica inerente a todo ser humano?

Em tempo: a fonte da info sobre etimologia é o (excelente) site Origem da Palavra.